Segundo Alberto Gonçalves, ontem, no DN.
Uma conspiração de estúpidos
Quando não assiste a partidas
de futebol ao lado do excelentíssimo Presidente Marcelo ou inaugura cidades do
futebol (?) ao lado do excelentíssimo Presidente Marcelo, António Costa diz
coisas. Há dias, com a habitual sofisticação, disse por exemplo que o PSD
defende os exames apenas para apurar "a raça dos eleitos". Quem nos
dera que fosse verdade: a exigência escolar, caso existisse, separaria os
espertos dos espertalhões e, entre outras vantagens, impediria que criaturas
sem préstimo chegassem a primeiro-ministro. Como a raça se mede por baixo, são
os literalmente não eleitos que mandam nela e dispõem de poder para cometer as
calamidades que bem entendem.
Também há dias, o dr. Costa - que em Junho
passado lamentou que Portugal não comemorasse o 1.º de Dezembro ou, na
ilustrada cabeça dele, "a sua data fundadora" - convocou uma
cerimónia solene para devolver à nação os quatro feriados que lhe faltavam:
Corpo de Deus, Implantação (género prótese) da República e Todos-os-Santos,
além do citado. É o retorno dos "momentos históricos" do eng.
Sócrates, que chamava fanfarras para inaugurar um armazém de pneus. Só é pena
que o dr. Costa não organize liturgias assim bonitas para assinalar cada
aumento dos combustíveis.
Na presença de vultos do calibre dos ministros
da Cultura e da Defesa, do sr. Pio e de um ex--vice-presidente de Vale e
Azevedo, todos ilustres representantes da capacidade selectiva do nosso ensino,
o dr. Costa notou haver "princípios, valores e acontecimentos fundamentais
cuja memória e celebração não podem estar à mercê de cálculos ocasionais, de
impulsos ideológicos e de fins propagandísticos". Felizmente, os tais
feriados não devem integrar as categorias acima, pelo que se adaptam com primor
aos cálculos, à ideologia e à propaganda. Depois, com o fervor épico de um
almirante Thomaz, o dr. Costa falou em "pedagogia cívica",
"sentido patriótico", "atitude contemporânea" e
"capacidade de mobilizar" os portugueses. Tudo isto a pretexto de uma
golpada de rústicos e de uma insurreição que nos livrou do salário médio
espanhol, mais as festas cristãs que tanto comovem a maioria de esquerda.
Enquanto sociedade, nunca nos distinguimos pela
lucidez, traduzida na responsabilização dos políticos e na suspeita de que os
actos implicam consequências. Mas começa a ultrapassar-se até os nossos
folgados limites. Não é a questão dos feriados, irrelevante sob ambas as
perspectivas, mas o Carnaval grotesco que adorna a respectiva
"reposição" e esconde mal, muito mal, o resto. Não é o regresso à
perigosa leviandade de Guterres e Sócrates, mas o gozo infantil que agora a
acompanha. Não é o altíssimo risco de nova falência e de novo
"resgate", mas a alegria ou a apatia com que os aguardamos. Não é o
sermos enganados, mas o sermos enganados por burlões desastrados e assistirmos
resignados à burla.
A palavra final ao dr. Costa: "Temos de
saber que Portugal não começou connosco nem vai acabar connosco." Pois
não: o provável é que eles acabem com Portugal. Ao lado do excelentíssimo
Presidente Marcelo.
Os descaminhos da fé
As más notícias sucedem-se. Não
só o Estado Islâmico já ameaça directamente Portugal como continua a recrutar
portugueses, sobretudo em Lisboa e na zona centro. O único consolo chega das
autoridades belgas, que enfim descobriram a explicação para a capacidade de
sedução do bando de psicopatas: "Os nossos jovens são vítimas de SMS
propagandísticos." E de "predadores", acrescenta o Guardian.
Trata-se, afinal, do que sempre suspeitei: aquilo no fundo é gente impecável,
desviada pelas proverbiais más companhias para rebentar com terceiros e outros
gestos talvez censuráveis. Antes que a coisa chegue ao aqui norte, à cautela já
desliguei o telemóvel.
Da vergonha diplomática
Em Outubro passado, o caso Luaty Beirão inspirou
Mariana Mortágua a escrever uma crónica violentíssima no Jornal de Notícias.
Aí, a deputada do BE atacava com firmeza "a impunidade de que José Eduardo
dos Santos beneficia para manter o seu regime de corrupção e ataque aos
direitos humanos". E não se esquecia, antes lembrava-se a cada parágrafo,
de apontar as "especiais responsabilidades" do governo português
"nesta vergonha diplomática". Estava lá tudo: o ministro Machete, que
se desculpava pelas investigações a figuras do regime de Luanda; o ministro
Portas, que visitou a cidade; Cavaco Silva; Ricardo Salgado; etc. Enquanto, por
reles interesses materiais, o poder daqui fechasse os olhos ao poder de lá, a
apurada sensibilidade social da dona Mariana nem a deixava dormir em condições.
Que mulher enorme.
Infelizmente, bastou um semestre para encolher.
Há dias, Luaty Beirão e os seus parceiros foram condenados a cinco anos de
prisão e, para que não a acusassem de incoerência, a dona Mariana voltou à
carga no JN. Nova crónica, a velha luta pela liberdade de expressão. Pelo meio,
nem uma referência ao nosso governo. O governo alterou as relações económicas
com Angola? Descontadas as encenações na AR, não consta. Nem consta que a
anunciada visita àquelas bandas do PM (e do PR) seja acompanhada por um
exército libertador. O que mudou? As conveniências, ou os titulares do governo e
o apoio do BE ao mesmo.
Se custa ver PSD e CDS votarem ao lado do PCP,
nesta ou em qualquer matéria, custa mais ver as meninas do Bloco passarem por
campeãs dos direitos humanos. A menos que a pulhice tenha agora outro nome.
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