É o que diz aqui Helena Matos, e eu estou totalmente de acordo.
«Eu sei que devia escrever
sobre o orçamento ou, mais pertinente ainda, sobre a queda em desgraça do
Tribunal Constitucional que se limitou a decidir como sempre fez ao longo
destes últimos anos – protegendo os membros da corporação Estado – mas que
desta vez, e ao contrário do que tem acontecido, acabou criticado por quase
todos. Mas o que tenho para escrever sobre o assunto ainda acaba a colidir com
a assepsia do dia de reflexão e longe de mim perturbar voluntaria ou
involuntariamente a reflexão de quem quer que seja. Presumo até que por estas
horas, sentadinhos em tapetes, no cimo de serras e nas profundezas das grutas
milhares de portugueses em posição de lótus procuram avaliar as diferentes
propostas eleitorais. Que não acabem com o cérebro e as costas feitos num oito
é o que lhes desejo. E foi assim que, de assunto em assunto, acabei noutra
eleição ou mais propriamente nos óscares, cerimónia regra geral aborrecida para
todos os mortais à excepção dos candidatos mas que acabou transformada em
acontecimento mundial.
Os óscares ganharam agora
outro foco além do cinematográfico propriamente dito. Trata-se da cor da pele e
do sexo dos nomeados. Enfim o cinema é uma indústria e a indignação também e
cada um faz nessas indústrias o que quer ou pode para ganhar a vida. Mas à
liberdade dos senhores Will Smith e Spike Lee de dizerem e fazerem o que lhes
apetece – nomeadamente o anúncio de que não participarão na cerimónia dos
óscares por só terem sido nomeados actores no dizer deles caucasianos (confesso
que no caso do Stallone após tantas operações e tanto botox nem consigo
garantir que ele seja humano, quanto mais caucasiano ou asiático!) –
corresponde o direito dos outros lhes responderem que boa parte do que dizem
não passam de rotundas parvoíces.
Mas vamos ao assunto
propriamente dito: este ano não há negros entre os actores candidatos aos
óscares. Por acaso também não vislumbrei por lá nenhum chinês, ou melhor
dizendo asiático. Claro que também não há mulheres gordas nem feias. E quanto a
idades seríamos levados a acreditar que o sexo feminino desaparece da face da
Terra passados os 35 não fossem estar candidatas as anciãs Cate Blanchet
(nasceu em 1969) e Charlotte Rampling, que veio ao mundo em 1946 e a quem as
declarações que fez sobre este assunto – “racismo contra brancos” – devem ter
feito perder qualquer possibilidade de ganhar a estatueta (isto apesar de
Charlotte Rampling se ter apressado a pedir desculpa e dizer que foi mal
interpretada).
A questão racial tornou-se o
mais patético exercício de promoção do coitadismo, sobretudo entre os negros
norte-americanos. que é o mesmo que dizer que em todo o mundo a que chegue a
televisão. O que não fazem ou não conseguem é invariavelmente o resultado do
racismo e nunca do seu não esforço ou desinteresse. Em Portugal, temos nesta
matéria o incontornável paradoxo de se explicar com o racismo e os problemas
associados à imigração os fracos resultados escolares dos alunos ditos
africanos. Note-se que a não ser que a Amadora ou Moscavide fiquem em África
não há razão alguma, a não ser a cor da pele, para que se chamem africanos a
estes jovens nascidos em Portugal, frequentemente filhos de pais nascidos
também em Portugal. Curiosamente ninguém se interroga sobre os brilhantes
resultados escolares dos filhos dos ucranianos, que pouco tempo depois de
chegarem a Portugal se tornam nos melhores alunos das suas turmas.
Sob o silêncio em torno deste
assunto, nomeadamente o silêncio de muitas daquelas associações que vivem de
denunciar o racismo e que na minha opinião em vez de o combater o promovem,
guetizando ainda mais aqueles que deviam integrar, esconde-se um arreigado
paternalismo, esse sim racista, que na prática se traduz por isto: os
ucranianos são brancos, têm olhos azuis e para mais vieram daquele caldeirão do
ex-mundo comunista, logo politicamente não interessam a ninguém. Pelo contrário
os negros (e agora também os muçulmanos) vivem mediaticamente falando sob a
tutela da esquerda. Esta primeiro quis libertar África. Transformadas essas
libertações em embaraçosíssimas ditaduras, entende agora a esquerda que há-de
transformar no seu novo eleitorado essa multidão, que em boa parte teve de
deixar África porque as tais libertações só produziram miséria. Com as classes
trabalhadoras a descrerem cada vez mais das virtudes do socialismo, promover o
ressentimento e o assistencialismo numa população para mais jovem é uma boa
forma de garantir os votos por largos anos.
Nos EUA temos a juntar a tudo
isto Hollywood e o puritanismo. Assim, com aquele frenesi que os levou à Lei
Seca e destrambelhos quejandos, atiram-se agora às questões que se dizem de
género e a tudo o que vagamente possa ser relacionado com o racismo. Há de tudo
e para todos os gostos. Como não é humanamente possível seguir todos os
racismos por ali denunciados resolvi focar-me na problemática dos homens
asiáticos que denunciam que o cinema os discrimina. Porquê? Entre outras coisas
porque nunca são vistos como desejáveis pelas mulheres brancas! A esta
assexualização dos homens corresponde, segundo os promotores desta causa, uma
sexualização das mulheres asiáticas. Enfim acabaremos literalmente a discutir a
cor dos anjos mas não quero sair deste assunto sem lançar eu mesma uma outra
causa: a das mulheres brancas que nos filmes ficam sempre a perder para as
asiáticas que, para lá doutras vantagens estéticas, são sempre enaltecidas
pelos guionistas, homens obviamente, porque não falam: nos filmes ocidentais as
mulheres asiáticas aparecem invariavelmente como seres de poucas ou nenhumas
palavras. Ora uma mulher silenciosa, ou mais propriamente uma mulher que não
lhes diga a verdade, é o sonho de qualquer criatura do sexo masculino nascida
no Ocidente. E assim esta minha causa junta não só o combate ao racismo face às
mulheres asiáticas, mais o racismo perante as mulheres brancas como ainda
combate o machismo dos homens ocidentais. Fantástico não é? Ainda acabo nos
óscares!
Quero acreditar que a
histeria terminará. Que um dia seremos capazes de reflectir sobre o
proselitismo que levou a situações tão aberrantes quanto a vivida em Rotherham,
Inglaterra: em pleno século XXI, 1400 crianças que estavam sob a tutela dos
serviços sociais foram abusadas sexualmente. Os abusos duraram anos. O facto de
os abusadores serem de origem paquistanesa levou a que durante anos e anos não
só não se fizesse nada para acabar com aquele pesadelo como os poucos que o
tentaram denunciar acabaram a ser confrontados com acusações de racismo e
desadequação aos valores multiculturais.
A falta de destaque noticioso
sobre o caso de Rotherham, que contrasta por exemplo com a indignação com os
abusos sexuais levados a cabo sobretudo no século passado por sacerdotes
católicos, é sintomática da hipocrisia que reina nesta matéria, hipocrisia que
ela sim é uma forma de racismo. Porque uma violação é uma violação
independentemente de quem a pratica e de quem a sofre.
E agora ou escrevo sobre o
sucedido em Colónia ou, opção bem mais interessante, sugiro que nas
intermitências da empastelada noite dos óscares vejam um filme. Chama-se Cowboys.
É de 1972 e tem como principal protagonista um John Wayne já velho o que não
lhe tira nada daquele sugestivo andar que ninguém explicou tão bem enquanto
símbolo da masculinidade quanto o actor Nathan Lane na Gaiola das Malucas.
Mas voltando a Cowboys a história nem é muito original: Wil Andersen(Wayne) um
rancheiro para quem a vida não deve ter sido meiga vê-se por circunstâncias
várias à frente de um grupo de rapazes, os cowboys possíveis já que os
homens adultos tinham desaparecido em mais uma corrida ao ouro. Wil
Andersen (Wayne) tem
de levar a sua manada para um local que fica a 650 quilómetros. É fácil
perceber que a viagem se transforma num ritual de passagem dos rapazes para o
mundo dos adultos.
Contudo o filme não é hoje
propriamente considerado uma fita familiar. Antes pelo contrário. Ora porque Wil
Andersen (Wayne) tem
um entendimento da educação dos rapazes nada consentâneo com as pedagogias de
hoje, ora porque reproduz todos os estereótipos da masculinidade e, cereja no
topo do bolo, porque a palavra nigger é pronunciada no filme a propósito do
cozinheiro Jebediah Nightlinger interpretado
por Roscoe Lee Browne. Perante o primeiro negro que viam na sua vida os miúdos
não só proferem nigger várias vezes como pretendem saber se
aquela negritude abrange todas as partes do seu corpo.
E assim os jovens de hoje
podem ver filmes com sexo, violência e consumo de drogas à vontade mas claro
nenhum adulto responsável pode gritar com eles como faz Wil
Andersen (Wayne) no
filme e claro que os negros passaram a afro-americanos, os chineses a asiáticos
e por aí fora.
Perante o desconchavo de tudo
isto só apetece recuperar a resposta de Roscoe Lee Browne, sim o mesmo que faz
de cozinheiro em Cowboys e que era um notável intérprete de
poesia e textos clássicos e dono de uma dicção fabulosa, àqueles que o acusavam
de ter uma voz demasiado branca: “Peço desculpa tivemos uma mulher a dias
branca.»
1 comentário:
Delicioso e inteligente texto, caralgos me frodam!(Politicamente incorrecto, eu). Os politicamente correctos, pretos ou brancos ou às cores são, simplesmente,repugnantes e, na verdade, verdadeiros criminosos éticos. E mai'nada...
Jofre Bentinho
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