... repetir.
7 de março de 2016
“Os inimigos da liberdade (dos outros)”
Um excelente artigo este, de Alexandre Homem Cristo, no Observador:
Agosto de 2014. Publico, no
Observador, um artigo de opinião sobre a (falta de) exigência no acesso
à carreira de professor e o seu efeito na degradação da qualidade do ensino
público. Nesse dia, um vulcão de ódio explode nas minhas contas de e-mail e
facebook. Na caixa de comentários do jornal, dezenas ocupam-se a escrutinar (e
a inventar) a minha biografia – quem são os meus pais, onde cresci, onde
estudei, onde trabalhei, com quem fui visto. A difamação (pessoal e
profissional) estende-se aos blogs e às redes sociais. Recebo ameaças de
agressão, vindas de quem afirma saber onde moro. Sou insultado e alvo de todo o
tipo de calúnias. E, nos meus locais de trabalho, e-mails, cartas e
abaixo-assinados exigem o meu despedimento. A discordância não bastou, quem não
gostou do que leu tentou lixar-me a vida.
Bem sei que este episódio pessoal
nada tem de excepcional. Quem escreve nos jornais colecciona episódios
similares com professores, enfermeiros, ambientalistas, defensores dos animais.
Ou alentejanos, como aconteceu nestes dias com o (meu amigo) Henrique Raposo, a
propósito do seu livro “Alentejo Prometido” (FFMS, 2016). De facto, situações
do género, com diferentes graus de gravidade, sucedem vezes demais para que
ainda haja quem se faça desentendido quanto ao essencial – estar-se do lado da
liberdade de pensar, dizer e escrever, mesmo quando se discorda do que os
outros pensam, dizem e escrevem. E, no entanto, desentendidos há.
O ódio existe e existirá sempre. Daí
que a questão não esteja tanto no asco incorrigível e efémero que habita as
redes sociais, mas em quem o legitima e se alimenta dele. É simplista apontar o
dedo às redes sociais, dizer cobras e lagartos do facebook e jurar desprezo
eterno à internet. Mas não é eficaz. O culpado das proporções que o ódio
cibernético atinge não se chama Mark Zuckerberg nem facebook. E, por maior
impacto que tenha a sua boçalidade, os principais inimigos da liberdade não são
os idiotas anónimos que berram, queimam escritos ou insultam quem os escreveu.
São, afinal, os que se calam, os que receiam enfrentar a multidão, os que
justificam as agressões com um “ele pôs-se a jeito”, os que toleram o
intolerável e encontram um ângulo para encaixar a violência desde que os
violentados pensem de maneira diferente da sua.
Infelizmente, muita gente que
deambula no espaço público demonstrou viver num tempo que é mais velho do que
novo. Não é de agora e a perseguição ao Henrique Raposo só serviu para nos
avivar a memória. Que vários alentejanos não tenham reconhecido as suas raízes
no livro do Henrique é respeitável, embora se lamente que o tenham expressado
por via da intimidação. Mas que outros (e foram tantos) tenham validado essa
intimidação ultrapassa os limites da intolerância. Por exemplo, aGaleria Tintos e Tintas,
onde em Lisboa deveria decorrer o lançamento do livro, não quis estar envolvida
na polémica, encolheu-se e cancelou. Por exemplo, Nicolau Breyner,
em declarações ao DN, gracejou sem graça: “fazem bem os alentejanos em
ameaçá-lo. Estou a brincar, ninguém deve ser ameaçado, mas devia pensar bem no
que escreve”. Por exemplo, Francisco Louçã reduziu o assunto a um não-assunto e,
sem uma palavra acerca das ameaças ao Henrique e à família, sentenciou que
“fazer desta coisa que foi cometida por Raposo um caso nacional é que só mesmo
por desfastio”. Os cobardes, os que acham que se deve “pensar bem” antes de
escrever, e os que desdramatizam a violência contra os seus adversários
políticos. Eis aqueles que dão força à intimidação das redes sociais. São eles
os maiores inimigos da liberdade de expressão.
Habituámo-nos a que o exercício da
liberdade seja um acto trabalhoso, de bravura e de resistência contra a javardice. Mas
habituámo-nos mal. A liberdade tem um preço, já se sabe, mesmo que não devesse
ser assim. Mas o que poucas vezes se assinala é que esse preço só se cobra a
alguns, já que as liberdades que se reconhecem a uns não se toleram a outros. O
Henrique Raposo não foi o primeiro a escrever sobre a relação amoral da região
com o suicídio ou sobre a opressão das mulheres no Alentejo dos seus avós (e,
de resto, ainda hoje). Mas ao Henrique não se perdoa que o tenha feito. Afinal,
tudo o que separa a tolerância da intolerância é um nome – o do autor. Pode ser
que, da próxima vez que se marchar pelos direitos conquistados no passado de
Abril, haja alguém que lembre a batalha concreta do presente: a liberdade no
Portugal de 2016, porque depende de quem a exerce, ainda não é um valor
absoluto.
5 de março de 2016
Dos "liberais preocupados"
Há por aí pessoal particularmente sensível à "preocupação" relativamente a Trump ser liberal ou não.
É, quanto a mim, uma preocupação selectiva, tanto quanto se "houve
desvios" quando os governantes comunistas fazem chegar a respectiva
coutada ao tão almejado destino.
"Trump vai fechar fronteiras". Não vai. Vai colocar barreiras
substanciais a quem pensa poder entrar por ali dentro sem dar cavaco. A
malta "sensível" parece ter deixado de perceber que anormal é o
contrário.
"Trump não quer o livre comércio". Quer, mas primeiro está a liberdade
dos americanos. A malta "sensível" parece ter dificuldade em perceber
que é isso que se espera de um decisor político face ao seu próprio
país.
Na EURSS parece ter-se tornado normal que quanto pior for o desempenho
de um político face aos seus próprios, melhor. A prova está no espanto
com que encaram as declarações de Schäuble face aos militantes
caloteiros e aos inventores de países e economias zombie, economicamente
estimulados pelos bancos centrais, eufemismo para luminárias estatais.
" ... ahh ... mas ele vai fechar o mercado dos EUA aos outros países". É
muito provável que por aí comece, e será especialmente eficaz se,
paralelamente, demolir a 'red tape' que lá, como aqui na EURSS,
atravanca toda e qualquer vontade de se trabalhar que não seja apenas
para aquecer ... os bolsos da militância estatal em mandar na vida dos
outros.
" ... ahhh ... " voltam à carga, "mas nenhum país pode fechar-se ao
comércio internacional". Pode, se o fizer temporária e selectivamente e
se tiver um mercado interno monstruoso e concorrencial, e imensos
recursos naturais que explore .. demolindo a 'red tape'. Não é o caso de
Portugal em qualquer dos aspectos.
" ... mas ele não tem planos para um rumo dos EUA". Ainda bem. De
timoneiros está pejada qualquer máquina estatal, particularmente as
monstruosas como a nossa (de Portugal e da EURSS). Ele que defenestre as
luminárias e que permita que cada um governe a sua própria vida.
2 de março de 2016
Subscrever:
Mensagens (Atom)